Escola Lacaniana

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Seminário “Psicanálise com Crianças e Adolescentes” fecha agosto recebendo o psicanalista José Nazar

Dia 30/08, o Seminário “Psicanálise com Crianças e Adolescentes”, coordenado pela psicanalista e membro da ELP-RJ, Teresa Palazzo Nazar, recebe o psicanalista, membro-fundador das ELPs, José Nazar, para falar sobre o tema “Vidas Interrompidas”. Confira abaixo o que ele pretende trabalhar na atividade, que é aberta, gratuita, online (via Zoom) e começa às 19h30.

“Há um fato novo. É preciso dizer que ele é antigo também. Mas o importante é que sua incidência cresce e diz respeito a todos nós: filhos estão morrendo antes dos pais. Este acontecimento, traumático por excelência, apresenta-se como alguma coisa extremamente obscena, insólita e desagradável. Mais ainda num momento da civilização em que os pais nunca investiram tanto em seus filhos, no sentido de uma preparação para um futuro sólido, sustentável, de um possível amor à vida. ​
​Hoje, crianças e jovens mais saudáveis, mais investidos pelos pais, parecem ter melhor saúde física do que os das gerações anteriores. Entretanto, na vida emocional, aparecem as fragilidades, cabeças sofridas, desamparo. Os transtornos psíquicos atravessam a vida da criança e do jovem, provocando angústia neles e nos pais.
Sendo agente da Lei, o pai funcionava na família como garantidor do desejo nos filhos – seja dentro de casa, ou a partir de seus deslocamentos nas escolas e nos segmentos públicos – , na medida em que interditava uma relação incestuosa da mãe com seu rebento. Mas o que mostra a nossa contemporaneidade ? Que o pai não tem mais a mesma efetividade no fazer valer suas insígnias, no sentido de tecer os limites, as proibições, as frustrações, que são os elementos necessários, para um desenvolvimento adequado.​
​Quando o jovem coloca fim à sua própria existência, ele está interrompendo a um só tempo, tanto a transmissão de valores familiares construídos ao seu redor, quanto ao que era esperado que ele pudesse retificar em relação à herança recebida de seus antepassados, a partir de um universo de novas significações. Ou seja, ele coloca por terra o sentido da vida, as possibilidades de toda e qualquer realização futura, inclusive a da procriação. Dessa maneira, o jovem elimina o único elo que lhe permitiria dar seguimento aos ideais que tiveram início em seus antepassados. Esses valores, verdadeiras marcas e insígnias de uma historicidade dos ancestrais, franqueariam, uma vez transmitidos, as gerações futuras, num “ lance de dados” que, tendo sorte, renovaria o mundo.
​Sabemos que o ato suicida refuta a continuidade de uma ordem genealógica, elimina a esperança em relação a um possível redirecionamento da vida, em seu porvir. Algo aí é mutilado, elidido; apaga-se o tempo real de uma linhagem de uma nova história, quase sempre pronta a ser revitalizada, corrigida em seus desvios, procurando não repetir os mesmos erros daquela que a precedeu. Em todo caso, o que temos é a realização de um gesto por demais agressivo, dirigido ao lugar da Lei, ao pai. Também podemos interpretar como uma tentativa de apagamento da transmissão de um pai , na passagem de sua herança (simbólica): o sujeito que interrompe sua vida quebra o pacto implícito no ordenamento das gerações. ​
​O jovem que atenta contra a sua vida pode estar sofrendo os embaraços de uma dor herdada de gerações anteriores. Por alguma razão, não conseguiu reverter o rumo da história recebida, daí sofrer os efeitos devastadores dos ideais contrariados de seus ancestrais. De todo modo, ele pode estar gozando, numa posição de vítima da história, vítima dos infortúnios que recebeu e que não conseguiu reverter . O sujeito que se vê vitimado está em sofrimento.
Sua dor de existir o autoriza a acusar o outro, isto é, seu pai, sua mãe, seus avós, o mundo! Todos lhe devem.
Por alguma fragilidade psíquica – são aqueles sofrimentos psíquicos mais avançados, vale dizer, as melancolias –, ele não conseguiu se dar a chance de assumir, se apropriar de sua própria história, para retificar a má sorte de uma vida que lhe impôs uma maldição. Entretanto, não há culpados…
Quando um jovem interrompe sua vida, acabou! Esse fato será sempre de uma gravidade incomensurável. ​
É preciso tornar-se responsável pela história que se recebe e pelos efeitos inconscientes desta – seja de uma boa ou má sorte.
A herança simbólica recebida cessará de ser transmitida para filhos e netos, quando cometido o suicídio. Restará um vazio, nada mais que um ponto de sacrifício, habitado por interrogações silenciadas. Herdamos uma vida por onde florescem todos os pecados do mundo, vale dizer, do pai, da mãe, dos nossos antepassados. Votos de vida e votos de morte. Queiramos ou não, cada um de nós irá lidar com uma insatisfação fundamental que é estrutural do humano. Cada um de nós terá que aprender a lidar com a sua história de uma maneira particular, a partir de um estilo de vida. Mas temos oportunidades e meios para mudar os rumos de uma má sorte. Hoje, mais do que nunca, o amor dos pais funciona como um verdadeiro instrumento motivador de possíveis mudanças na vida dos filhos. Os pais esperam que seu filho ou sua filha promovam mudanças em suas vidas, que experimentem um futuro promissor, mais leve, menos sofrido.
Os órgãos governamentais de saúde pública, muito cedo perceberam que a saída para quebrar a virulência de uma vida interrompida seria criar lugares de trabalho, onde o sujeito possa falar e ao fazê-lo, escutar-se naquilo que está dizendo. Lugares de acolhimento, portanto, tão somente a partir do uso da fala.”

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