“A angústia, essa filha da noite, que preside o saber, antes vivida como morte, pode vir a tomar outros caminhos. A falta de palavras sucede o bordado luxuriante dos mesmos”
Celso Pereira de Almeida
Selecionamos aqui uma série de escritos do autor, textos publicados no tempo de sua formação na Escola Lacaniana de Psicanálise – RJ. Cabe uma pergunta: o que é publicar os escritos do percurso de um psicanalista que morreu sem participar da seleção de seus textos, portanto, sem autorizar tal publicação?
Amor é tempo, como bem o disse Celso. E por isso, no tempo de luto possível, a escola a qual ele pertenceu decidiu-se a tornar público seus escritos.
Podemos abordar a questão dos tempos de uma análise de diversas maneiras: a duração da análise, o tempo da sessão, o início e o fim, o tempo necessário para chegar ao fim, os tempos da transferência e seus movimentos, a resistência, a interpretação, a construção da fantasia, a persistência dos sintomas, o tempo de suspensão da angústia, o tempo da associação livre, etc. Com toda essa diversidade de questões clínicas, pode-se dizer que os tempos de uma análise são tensionados entre a duração e o instante. A fala da associação livre e a descontinuidade na intervenção do analista e de seu ato.
Quando Freud descobriu a psicanálise e a formalizou, constatou que a temporalidade do inconsciente contestava a temporalidade cronológica, que atormentava a consciência dos humanos. Freud desde o inicio afirmou a intemporalidade dos processos psíquicos inconscientes.
Toda psicanálise orienta-se a partir da construção e do desvelamento da fantasia fundamental que permite ao sujeito uma vez resituado no tempo presente do trabalho de transferência, reposicionar-se frente à intemporalidade das formações do inconsciente.
A análise introduz tempo. O ato do psicanalista introduz uma descontinuidade “em tempo”, com o corte da sessão.
No texto “De passagem, um tempo”, o autor nos diz: “se o sujeito é efeito de significante, seu tempo é do só-depois e seu meio é a palavra”.
A proposta desta revista é publicar as palavras, significantes que percorreram o tempo da formação de um psicanalista.
O autor afirma que “amor é tempo”, e se questiona sobre suas consequências em uma psicanálise.
“A instância do tempo se apresenta diferentemente em cada momento”; e mais, “Tempo é temporal e sendo uma articulação de momento significante.”.
Quando estávamos lendo os textos do Celso para selecionar o que gostaríamos de colocar nessa publicação, lembramo-nos do dito de Lacan no seu texto:
“Ata de fundação”, onde ele afirma que todos os esforços e recursos de uma escola de psicanálise devem estar destinados às publicações.
No dicionário “Aurélio” de língua portuguesa, a palavra publicar tem um significado de “levar ao conhecimento do público, publicar uma lei”. Para a psicanálise, a lei é do desejo.
Ao fundar sua escola Lacan ressalta que o discurso psicanalítico visa tratar o real pelo simbólico. O que isso quer dizer? De um texto escrito o que podemos recolher de escritura de um sujeito, isto é, de sua enunciação?
Em Rolland Barthes, no texto “O prazer do texto”, encontramos a palavra escritura como o que designa o texto de gozo de um sujeito, quer dizer, aquilo que de sua real enunciação pode comparecer na escrita do texto. Aprendemos assim, que toda escritura é uma escrita, mas nem toda escrita é uma escritura. Freud deixa um legado para os psicanalistas: transmitir a psicanálise. Isso
pode se dar pela via do escrito, e ou da fala.
Acreditamos, assim, que o que pudemos recolher dos restos recolhidos deste autor são sua escritura; seu legado não só à Escola Lacaniana de Psicanálise – RJ, mas a comunidade dos psicanalistas.
Nem todos puderam escutar a fala de Celso, mas todo aquele que ler esses escritos poderá escutar sua voz.
Amanda Andrade Lima,
Sonia Maria Lima Rejani
Teresa Palazzo Nazar